sexta-feira, 22 de novembro de 2013

Ampulheta

sobre um corpo deitado
- o inerte -
o tempo que passou
e deixou a poeira
para contar

nos olhos repousados
- o escuro -
o que não foi
tudo que pode
e não é
mas existe...

poeira formam teias que trazem aranhas
corpos atraem outros corpos
areias e terras migram seus grãos
lado, outro, cima, baixo, ponta, regresso

a única paragem dessa vida
é o respiro
o resto é branco

cinza para o que fica

sexta-feira, 15 de novembro de 2013

Quando cheguei na cidade sem mar




de sorriso na boca
olhos inchados

um amigo peludo por duas noites
seu choro fez ele partir

quando cheguei na cidade sem mar
fui parar em outra cidade
para chegar nesta cidade

onde meu sono crescia
e me fazia acordar tarde

onde quase ninguém tinha carro
e eu ralei muito os joelhos

ganhei a primeira bicicleta
roxa com cestinha e garupa

meus primeiros amigos de outro lugar
as primeiras palavras que não sabia entender
e as que dizia e ninguém entendia

mais dois irmãos e outra mãe
um quarto só meu
que aos feriados era também da minha mãe de verdade

outro amigo peludo
que quase foi embora pelo cheiro forte do seu xixi

meu avô comprou uma casa pra ele
e fui feliz com o sono dele no meu bucho quase um ano

mudamos de casa várias vezes
vários amigos indo e ficando

mais dois amigos peludos
que também eram amigos:
um grande bem peludo
outro pequeno de pelo baixo

um carro vermelho levou meus amigos peludos para sempre

onze pessoas:
a casa das sete mulheres

mais outro ano
outra casa

outro amigo peludo bem pequeno de olhos de semente de mamão

e chegamos na nossa casa azul
onde estamos até hoje

quer dizer
hoje eu tenho duas casas
uma de dia e outra de noite

Livro Primeira Aparição da Manhã - Luciana Andradito

  SINOPSE “Primeira aparição da manhã” é uma seleção de poemas que compõem a primeira obra literária da escritora Luciana Andradito. Produzi...