Memória ancestral

dormi de vestido amarelo e sonhei com uma memória ancestral. era uma menina negra de cabelos curtos e altos ao vento, que andava vestida de amarelo no dia de iansã e brincava com as crianças o jogo de caça ao tesouro. no nosso território no meio da mata, encontramos folhas, flores, pedras, animais e insetos que eram nossos pequenos grandes mistérios. varremos todos os arredores, até que fuçando na casa dos brancos, encontrei o tesouro do meu povo escondido nas funduras do alicerce da edificação, cavando com as unhas descobri dois braceletes: um amarelo e outro branco. os escondi na saia do vestido e corri com o grupo de crianças para mostrar aos adultos nossas descobertas. ao verem os braceletes eles ficaram emocionados, cada um tocou as peças e se lembraram de seus pais, avós e bisavós, de suas histórias, danças, músicas e rodas que faziam. não sabia do tamanho do nosso tesouro e com as peças empunhadas e o espírito de iansã de frente, caminhei liderando todo o bando que colocou os ricos senhores brancos contra a parede, houve alguma luta, mas como eram minoria eles fugiram. nosso território virou enfim nosso lar. fizemos fogueira, comemos a comida dos antigos e dançamos e cantamos nossa liberdade.